quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Menina-dos-olhos

Este post já era pra ter saído há muito tempo, quando, recém-chegada em Sydney, comecei a ter minhas primeiras impressões daqui. Pois bem, quase quatro meses já se passaram (como é rápido!) e, apesar do atraso, acho que agora vai ser até melhor porque tenho muito mais o que falar sobre a cidade que me conquista um pouquinho mais a cada dia.

Não sei se é porque estou num país diferente, e, portanto, mais atenta a tudo à minha volta, mas a impressão que tenho aqui é que o tempo todo estou sendo ‘bombardeada’ com muita informação visual. Muito parecido com o que achei da Inglaterra também. E, como designer, fico ainda mais atenta a tudo. Aliás, por falar em design, como o Rique Nitzsche, meu professor da pós, nos alertou há tempos, aqui já vemos a sustentabilidade como uma preocupação natural. Só pra citar três exemplos: apesar de não vermos muitas latas de lixo, as ruas são impecavelmente limpas. Jogar uma guimba de cigarro no chão pode até dar multa. Nos mercados quase todo mundo já leva suas próprias ‘ecobags’ de casa pra evitar o uso exagerado de sacolas plásticas. E, na Target, uma famosa loja de departamentos, chega-se ao ponto de cobrar por cada sacola plástica utilizada para carregar as compras, com certeza também numa tentativa de evitar o desperdício. Por último, e talvez o que mais tenha me chamado atenção, em todos os banheiros as descargas vêm com duas opções de botões para apertar (não preciso nem explicar em que situação usar cada um, né?). Uma medida simples, mas que com certeza ajuda a evitar o desperdício de água.

Sustentabilidade à parte, vamos falar das pessoas, que quase sempre são as grandes responsáveis por fazer a fama de um lugar. E Sydney leva a sério a fama de ser alto-astral. Embora seja um importante centro comercial da Austrália, a formalidade do mundo dos negócios não a faz perder seu estilo de vida totalmente descontraído. O povo, alegre e hospitaleiro, torna a cidade ainda mais apaixonante. Bem verdade é que metade dos 4 milhões de habitantes da cidade é estrangeira e com uma simples caminhada pelo centro percebe-se como australiano é artigo em falta por aqui. Desde a minha chegada só conheci três: sendo que dois deles não são originalmente de Sydney. Além disso, vejo tanto muçulmano e, principalmente, oriental que às vezes me pergunto se estou mesmo na Austrália. Sem contar com os brasileiros que também estão em toda parte e são facilmente identificáveis: é sempre o grupo mais animado, falando mais alto. Aliás, falar que é brasileiro aqui é ter a certeza de receber um belo sorriso de volta e começar um daqueles papos sobre as maravilhas da nossa terra. É impressionante como os gringos adoram o Brasil, apesar da violência também ser mencionada constantemente.

Continuando a falar sobre pessoas, ainda me surpreendo com a educação da maioria que encontro dia a dia, nos mais diversos lugares. Pra começar, em qualquer escada rolante da cidade, se você não está com pressa, pare somente do lado esquerdo para deixar o caminho livre para os mais apressados. As pessoas de fato respeitam isso. Os motoristas de ônibus então são uma caso à parte: extremamente educados, andam somente nas ‘buslanes’ especificadas, esperam pacientemente a entrada e saída de cada passageiro e ninguém reclama. Isso quando eles não saem de seus postos para ajudar algum cadeirante ou alguma mãe com carrinho de bebê. Aliás, vale destacar aqui que todos os ônibus têm bancos móveis, que são lugares especiais reservados para essas pessoas. Há também um compartimento para colocar pertences mais pesados para que as pessoas não precisem ficar se equilibrando com mil bolsas e sacolas. Basta pegar no mesmo local antes de sair do ônibus. E nem preciso dizer que nada desaparece, né? Ah, sim, e tudo isso funciona também porque há limite máximo de passageiros permitidos em pé e o motorista nem sequer para no ponto se esse número já tiver sido atingido. Bem diferente das ‘sardinhas enlatadas’ do Brasil. Outro lugar que me chamou atenção pela educação das pessoas foram os supermercados. Sempre tem um funcionário pronto pra te ajudar a encontrar um produto, além do momento de pagar, quando você sempre é recebido pelo caixa com um ‘how are you today?’. Bem verdade é que caixas com pessoas aqui estão sendo gradativamente substituídos por auto-caixas, em que o consumidor registra toda sua compra sozinho, coloca nas sacolas, paga e vai embora. E alguém coloca algum item na sacola sem pagar? Claro que não!

Mais algumas curiosidades locais, merecem destaque: se você estiver na praia e ouvir uma sirene, saia logo do mar. É um aviso de que algum tubarão provavelmente conseguiu passar a rede de segurança submarina e se aproximou da praia mais do que deveria. Mas nada de pânico: é só sair, esperar um tempo e voltar. Para garantir que nada aconteça há salva-vidas na areia orientando os banhistas e helicópteros e barcos fazendo todo o monitoramento da região. Aliás, os sinais de travessia de pedestres aqui também funcionam com sirenes, que disparam como se estivessem liberando uma ‘boiada’ para atravessar a rua. Chega a ser engraçado! Outra coisa que me chama atenção aqui é uma ‘cultura do exagero’, às vezes meio parecida com a americana. Tudo que é besteira que você vai comprar vem acompanhada de uma promoção do tipo ‘leve 2 e pague 1’, com um preço muito melhor do que se você comprasse apenas um item. E você acaba comprando, mesmo sabendo que não precisa de outro chocolate pra satisfazer sua vontade de doce, por exemplo. Isso sem contar que é sempre mais barato comprar ‘junkie food’ do que ter um almoço saudável. E por falar em exagero, nunca vi um povo pra beber tanto! Olha que as regras para consumo de álcool aqui são extremamente rígidas: nada de consumo na rua ou na praia, só se compra bebida alcoólica em ‘bottle shops’ e, se você estiver em um bar ou boate, e o garçom achar que você já bebeu demais, ele tem o dever de parar de te servir ou pode colocar em risco seu emprego ou mesmo arrumar uma multa pro estabelecimento. E, se você achar ruim, azar, pode acabar expulso do local – acreditem, já vi isso acontecendo com pessoas próximas.

O agitado centro da cidade de Sydney não deixa nada a desejar à loucura do centro do Rio de Janeiro, mas é muito mais bem cuidado e de longe muito mais bonito também, com suas ruas largas e arejadas e um mix inusitado de arquitetura antiga com moderna. Mas, como carioca, o que ainda me impressiona mais é a segurança, Aqui ninguém se preocupa em segurar a bolsa fortemente pra evitar o roubo por algum trombadinha. Aliás, não existe pivete aqui, existem sim alguns raros pedintes, que ficam sentados segurando plaquinhas explicando os motivos de estarem pedindo dinheiro. O que pode irritar um pouco é a quantidade de pessoas distribuindo papeis e parando os pedestres pra pedir contribuição pra alguma instituição de caridade ou pra fazer propaganda de algum produto. Mas até isso às vezes pode ser benéfico quando um bar, por exemplo, coloca uma de suas garçonetes na porta do estabelecimento oferecendo experimentação gratuita de suas comidas ou bebidas. Uma boa forma de atrair novos clientes. 

Enfim, impressões pessoais à parte, se após ler tudo isso, alguém ficar com vontade de conhecer a cidade que será minha eterna segunda casa, não pode deixar de ir às praias de Bronte Beach, Manly, Watson’s Bay, Seal Rocks – um pouco afastada de Sydney – e, a minha preferida e onde tenho a felicidade de morar agora, a famosa Bondi (lê-se ‘bondai’) Beach. A noite australiana deixa um pouco a desejar e quase sempre termina bem cedo, mas é bem verdade que existe programação em qualquer dia da semana que se queira sair. Então, não poderia deixar de citar The Gaff às terças, Side Bar às quartas e Argyle às sextas, bares / boates que com certeza já marcaram minha temporada em ‘Sydnelson’. E, nos dias sem praia, o que não faltam são lugares imperdíveis: o gostoso bairro de The Rocks, a famosa Opera House junto à Harbour Bridge, a Universidade de Sydney, a confusão do Paddy’s Market e os milhares de parques espalhados pela cidade – destaque para o Hyde Park e o Victoria Park. Sem contar com uma bela caminhada de duas horas pela costa de Coogee Beach até Bondi Beach e no final parar para um chopp no Iceberg, um bar com uma vista incrível de onde às vezes até se avista alguns golfinhos – eu tive essa sorte. E, por último, meu lugar preferido de Sydney: Darling Harbour, que seja dia ou seja noite é simplesmente fascinante! É como a vista da Enseada de Botafogo, com o Pão de Açúcar ao fundo, no meu saudoso Rio de Janeiro: não importa quantas vezes eu passe por lá, sempre ficarei encantada. Enfim, como li em uma revista por aqui, “a menina-dos-olhos da Austrália é, sem dúvida, um lugar mágico para se conhecer”.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Três meses de escolhas

O texto sobre minhas impressões de Sydney mais uma vez vai ficar pra depois. Está enorme e quase pronto pra ser postado aqui, mas me dei conta de que hoje já faz três meses que comecei minha aventura australiana. Por isso estou aqui pra falar um pouco sobre esse período que, ao mesmo tempo que passou tao rápido, parece ainda muito pouco,perto do tempo que eu gostaria de ficar aqui ainda.

Desde que vim pra cá, percebo como já mudei de ideia várias vezes, Como vi alguns dos meus objetivos mudarem tantas outras. E o mais engraçado é como aqui os sentimentos e pensamentos aparecem de forma bem contraditória. Às vezes me sinto numa montanha-russa que de uma hora pra outra é capaz de me virar de cabeça pra baixo e me fazer questionar se não estou começando a ficar maluca por sentir tanta coisa diferente quase simultaneamente. Quem já teve ou está tendo a mesma experiência que eu provavelmente vai entender o que quero dizer:

- É muito bom ter, pela primeira vez, a responsabilidade de me virar pra me sustentar, mas por vezes sinto falta do conforto que tinha no Brasil.
- Também é ótima a experiência de dividir apartamento e acordar com a casa cheia logo de manhã, mas como às vezes sinto falta do meu quarto, de um cantinho só pra mim.
- Finalmente estou aprendendo a cozinhar – coisa que nunca achei que faria – e estou adorando, mas como sinto falta de chegar em casa e ter diversas opções prontas pra escolher na geladeira. Sinto falta acima de tudo da comida brasileira, especialmente da comida da minha casa.
- É ótimo perceber como estou completamente adaptada em Sydney e praticamente não me vejo morando por agora no Rio de Janeiro de novo, mas como sinto falta da cidade maravilhosa, com toda sua agitação, principalmente nessa época do ano.
- É interessante a possibilidade de fazer novos contatos em busca de um novo emprego, e com ele novos desafios profissionais, mas às vezes quero de novo a estabilidade profissional que de certa forma já estava começando a atingir no Brasil.
- Fico feliz todo dia quando encontro alguns amigos daqui e percebo a sorte que tive de conhecer pessoas tão maravilhosas que com certeza ajudam muito a preencher o vazio deixado pelos outros. Mas como sinto saudade dos meus amigos de sempre, alguns de uma vida toda.
- Sinto-me protegida a cada palavra de carinho e incentivo dos meus pais, seja por e-mail, carta ou telefone, mas como também sinto falta de abracá-los. É, não consigo encontrar aqui nada que “substitua” isso.
- Enfim,ao mesmo tempo que estou vivendo um sentimento novo, um friozinho na barriga por não saber o que me espera pelos próximos três meses – data inicial da minha volta – às vezes sinto falta da minha vida planejadinha de antigamente.

Bom, a verdade é que, dia-a-dia, vou tentando me entender, tentando descobrir o que quero e o que não quero – ainda que muitas vezes só por aquele breve momento. Às vezes quero ficar mais, às vezes tenho vontade de ir embora. Mas são nesses momentos que mais do que nunca percebo que existem os sacrifícios, os desapegos e coisas que a gente não quer largar. Como ir pra frente sem olhar pra trás? Pois é, não tem jeito. Escolhas têm que ser feitas, decisões tomadas. E eu escolhi vir pra Austrália há 14 anos atrás, quando pela primeira vez falei pra minha mãe que um dia ainda moraria aqui. E tomei minha decisão de vir de fato ano passado, deixando de lado o caminho conhecido, confortável, mais fácil. Vim sem garantias, respirando fundo e dizendo "eu vou".

E foi assim, com momentos bons e ruins (muito poucos na verdade), curtindo as novidades e as dificuldades, que eu passei esses primeiros três meses aqui. Não tenho ideia do que me espera pela frente. Talvez eu fique aqui apenas mais três meses, como previsto inicialmente, talvez eu prolongue minha vida australiana... Mas o que sei é que isso tem que ser mais uma escolha, a minha escolha.